Li-Fraumeni — Síndrome genética rara pode acometer uma família inteira com o câncer
Publicado em: 06/01/2023, 19:46
Uma predisposição genética e hereditária pode mudar o rumo de uma família inteira. É o que acontece com a Síndrome Li Fraumeni (LFS), que aumenta consideravelmente as chances de uma pessoa desenvolver o câncer.
A LFS chama a atenção entre as síndromes hereditárias de câncer por apresentar uma complexa variedade de cânceres em idade precoce. Os tipos de câncer mais comuns são: osteossarcoma, sarcoma dos tecidos moles, leucemia aguda, câncer de mama, câncer cerebral e tumores do córtex adrenal. Outros tipos de cânceres também são encontrados, porém, com menos frequência de relatos. A causa para o surgimento dessa síndrome são alterações genéticas (mutações) germinativas no gene TP53. Esse gene é considerado o "guardião do genoma humano".
Isabella Ortiz, Gerente de Produtos do laboratório DB Molecular e DB Patologia, laboratórios especializados em exames de Alta Complexidade, explica como a mutação ocorre no corpo: “O gene TP53 é responsável pela produção de uma proteína muito importante para o corpo, a P53. Por sua vez, essa proteína auxilia o corpo na identificação e na destruição de células anormais, ou seja, com alguma alteração genética. Quando ocorre a mutação nesse gene, há uma desordem na produção da proteína, que não atuará corretamente na defesa do corpo contra essas células cancerígenas. E com o crescimento acelerado de células mutantes surgem os tumores”.
A síndrome pode representar até 70% de chances a mais no aparecimento de cânceres para os homens e 90% para as mulheres, quando comparado com pessoas não portadoras da mutação.
SÍNDROME LI FRAUMENI E O ACONSELHAMENTO GENÉTICO
A LFS é hereditária e tem 50% de chance de ser transmitida de pais para filhos. O diagnóstico é feito por meio de exames de rastreio genético. Em casos positivos, é importante que irmãos, pais e filhos também façam o teste.
“Ter a mutação genética não significa que necessariamente aquela pessoa desenvolverá a doença, mas sim que ela precisará de um acompanhamento de perto. Apesar de raro, há pessoas que podem ter a mutação no TP53 e passar a vida inteira sem ter um diagnóstico de câncer. Em outros casos, pode surgir a descoberta de um tumor, tratar e curar-se totalmente. E, em ocasiões mais graves, podem ocorrer o diagnóstico de vários tipos de tumores ao longo da vida e o paciente passará longos anos em tratamento. Cada caso é um caso e deve ser avaliado individualmente”, explica a gerente.
Isabella ainda reforça que o fato de saber que tem a mutação e se informar sobre a doença é importantíssimo. “Muitas pessoas ficam em dúvida quanto ao fazer ou não um exame genético, mas ter a informação em mãos abre o caminho para diagnósticos precoces, com chances de cura mais elevadas. Além disso, proporciona a oportunidade de aconselhamento genético e uma construção familiar com mais clareza e consciência”, esclarece.
SÍNDROME LI FRAUMENI NO BRASIL
A LFS é considerada uma síndrome rara, porém no Sul e no Sudeste brasileiros não tão rara assim. A pesquisadora e médica geneticista brasileira Maria Isabel Achatz foi uma pioneira em estudar a LFS no Brasil após desconfiar que havia um paciente portador da mutação, em 1990. Na época, só havia 200 pacientes diagnosticados no mundo.
Apesar de improvável, os casos começaram a aparecer com mais frequência no país, considerando o resto do mundo. Foi aí que a pesquisadora mergulhou de cabeça nos casos e passou a investigar pacientes e seus familiares. Com anos de pesquisa, Maria Isabel Achatz chegou em um ancestral em comum entre todas as famílias, um tropeiro do século 18 que, em suas inúmeras viagens, acabou por “espalhar” a mutação nas famílias que formava.
A LFS no Brasil também tem algumas diferenças. Segundo pesquisas, a mutação genética no país aumenta em 50% a probabilidade do surgimento do tumor e está associada a uma mutação específica no gene R377H. Registros afirmam que, no Brasil, haja 1 a cada 300 pessoas com essa mutação. Em outras localidades, esse número chega a 1 a cada 20 mil pessoas.
Apesar do número alto de pessoas com essa alteração específica aqui no Brasil, essa mutação não é predominante nessa síndrome. A pesquisa de Maria Isabel Achatz pode ser lida na íntegra AQUI.
DIAGNÓSTICO DA SÍNDROME LI FRAUMENI
O exame para o diagnóstico da LFS é um teste genético realizado por uma coleta simples de sangue. O teste analisa especificamente o gene TP53 (exons 2-11) por meio da metodologia conhecida como NGS (Sequenciamento de Nova Geração) e métodos complementares como análises com CNVs (Variação do número de cópias) ou MLPA (Amplificação de sonda dependente de ligação multiplex) para detecção de grandes deleções ou inserções de material genético, quando necessário. O resultado deve ser interpretado por um médico geneticista e, para casos com resultados positivos, é fundamental a presença de um profissional especializado em Aconselhamento Genético.