Conheça as principais causas do Aborto de Repetição
Publicado em: 21/07/2020, 18:00
O aborto ocorre entre 15-20% de todas as gestações clinicamente reconhecidas. Abortamentos são situações que impactam diretamente a vida dos envolvidos, principalmente das mulheres que desejam ser mães. Neste momento, além de médicos especializados, pode ser indispensável o acompanhamento psicológico da mulher.
O que são abortos de repetição?
Médicos e especialistas definem aborto como a interrupção natural da gestação de até 22 semanas, com o feto pesando no máximo 500 gramas, o que representa aproximadamente até o quinto mês de gestação. De acordo com uma entrevista concedida pelo especialista fetal Mário Burlacchini, os abortos espontâneos são comuns na espécie humana. Sendo que alguns casos ocorrem antes mesmo da mulher ter observado um atraso menstrual e ter realizado o teste de gravidez. Logo nas primeiras semanas de gestação a chance de ocorrer um aborto é de até 40%.
Já os Abortos de Repetição (AR) são quando as perdas fetais ocorrem por mais de três vezes consecutivas. Alguns pesquisadores acreditam que a partir da segunda perda já deve-se ser pesquisada a causa do abortamento, porém outros recomendam iniciar a investigação logo após o primeiro caso, para evitar cicatrizes uterinas e transtornos emotivos e psicológicos no casal. Infelizmente, em alguns casos, não é possível identificar os motivos desta condição. Por outro lado, há outros fatores que podem ser a causa desta perda. É sobre estas possíveis causas que falaremos nesta postagem.
Quais as possíveis causas dos abortos de repetição?
Em primeiro lugar, deve-se lembrar que caso ocorra um abortamento é importante procurar auxílio médico. O ginecologista ou obstetra farão as recomendações adequadas baseadas no histórico clínico da gestante e do casal. Profissionais da medicina reprodutiva e geneticistas podem também ser envolvidos, auxiliando na identificação de alterações genéticas nos progenitores e alternativas possíveis para uma concepção segura e saudável.
Dito isso, confira as causas mais comuns para os abortos de repetição:
Figura 1: Causas de abortos de repetição *SAAF: Síndrome do Anticorpo Antifosfolípede – Sugiura-Ogasawara M, et al. Management of recurrent miscarriage. J Obstet Gynaecol Res. 2014 May;40(5):1174-9.
— Alterações genéticas
Estima-se que 0,7% dos nascidos vivos, 2% das gestações de mulheres com mais de 35 anos, 50% dos casos de abortos espontâneos ocorridos entre a 8ª e a 15ª semana de gestação e 60% das gestações em mulheres submetidas a tratamentos com reprodução assistida tenham perdas fetais devido a alterações genéticas no feto. As alterações genéticas mais comuns são as duplicações, trissomias ou perdas de cromossomo inteiro ou parte dele nas células do feto. Sendo recomendado sempre que possível fazer a análise genética do produto de concepção. Os progenitores também podem ter alguma alteração genética, onde as translocações balanceadas (quando ocorre uma troca de material entre cromossomos não-homólogos), translocações robertsonianas (quando dois cromossomos acrocêntricos se fundem próximos da região do centrômero, com perda de seus braços curtos) e inversões (quando em um mesmo cromossomo ocorrem duas quebras, e ambos fragmentos são religados em posição invertida) são as causas mais comuns. Nestes casos os progenitores são fenotipicamente normais, porém durante a formação dos gametas (óvulo e espermatozoide) podem ocorrer perda ou acréscimo de material genético que no feto podem ser incompatíveis com a vida, gerando o aborto.
— Anomalias anatômicas
Em geral, as alterações anatômicas estão no útero, responsável pela implantação do embrião. Portanto, malformações neste órgão — sejam congênitas ou adquiridas — podem ser a causa do insucesso da gestação, ou ainda a causa de gestações de risco. Alguns exemplos de alterações anatômicas são: septos uterinos, em que há uma redução do espaço de desenvolvimento do feto; útero bicorno, em que o útero está dividido em duas partes que se unem pelo colo; aderências no endométrio; miomas maiores que 4cm e outros.
— Alterações endócrinas ou metabólicas
Neste caso, o abortamento acontece em decorrência de problemas endócrinos ou metabólicos que impactam não apenas a mulher, mas também o desenvolvimento do feto. As alterações mais comuns que provocam abortos de repetição são: diabetes; distúrbios de tireóide; aumento da prolactina; síndrome dos ovários policísticos e insuficiência lútea. O ideal é que essas alterações sejam pesquisadas antes da concepção, para que possa ser feito o tratamento e que a mulher consiga ter uma gestação sadia, evitando ao máximo a perda fetal.
— Causas imunológicas
O feto é formado por material genético da mãe e do pai, sendo portanto um corpo estranho dentro do organismo da mãe. Durante a gestação, em condições normais, o sistema imune da mãe é suprimido para não haver um ataque imunológico contra o embrião, impedindo assim sua rejeição. Esta resposta imune protetora é chamada de Th2, se isto não ocorre e for ativada apenas a resposta Th1 pode ocorrer a rejeição do feto, impedindo a gravidez ou mais tarde provocando o aborto. As causas destas alterações imunológicas ainda são muito debatidas pela classe médica, havendo algumas possíveis causas como: Células natural killers ou NK (não há consenso na literatura sobre o que é considerado um número normal de células NK no endométrio), incompatibilidade entre o HLA do casal (a diferença genética entre os HLA do casal é importante para a implantação e o desenvolvimento do embrião).
— Trombofilias
São alterações nos fatores de coagulação que causam um aumento da formação de trombos, ocorrem devido a um desequilíbrio entre a coagulação (formação de trombos) e fibrinólise (destruição dos trombos). Quando a formação do trombo ocorre na placenta, a passagem de nutrientes e oxigênio fica comprometido, afetando o desenvolvimento do feto. Em geral, os exames de sangue comuns não identificam estas alterações, sendo recomendados alguns exames genéticos como pesquisa de mutações no Fator V de Leiden, na Protrombina, na Enzima Conversora de Angiotensina (ECA) e polimorfismo 4G/5G, além da pesquisa de anticorpos irregulares (SAAF) e deficiências em proteínas envolvidas com a coagulação (como as proteínas S e C).
— Hábitos e estilo de vida
Não são apenas alterações genéticas ou fisiológicas que ocasionam abortos de repetição. Pelo contrário, no espectro comportamental há uma série de fatores que interferem no sucesso da gestação. Os mais comuns são: o tabagismo, consumo excessivo de bebidas alcoólicas e uso de drogas, sobrepeso e sedentarismo.
— Fator Masculino
Alterações na qualidade e quantidade do espermatozoide podem influenciar na capacidade de concepção do casal, porém normalmente não são causa de abortos. Porém, estudos sugerem que o aumento da fragmentação do DNA do espermatozoide aumenta a taxa de aborto e pode estar associado com casos de aborto de repetição. As causas mais comuns de fragmentação alterada são devido ao fumo, consumo de bebida alcóolica e drogas, uso de alguns medicamentos, idade avançada, sedentarismo, obesidade e varicocele.
— Outras
Como mencionado no início do artigo, em diversos caso não são encontradas as causas para abortos de repetição. Por isso, cada vez mais são realizadas pesquisas e desenvolvidos testes para um diagnóstico assertivo. Recentemente, uma pesquisa realizada pelo Colégio Imperial de Londres apontou que a baixa qualidade dos espermas pode ser uma nova causa para esse quadro. Inclusive, fatores como idade e peso dos homens também são possíveis interferências para o desenvolvimento ideal da gestação. Esta informação é importante pois, muitas vezes, toda a carga de abortamentos recorrentes é atribuída às mulheres. Isso faz com que os profissionais busquem soluções focando apenas na saúde reprodutiva feminina, quando na realidade os dois parceiros precisam ser acompanhados.
Neste artigo, mencionamos as principais causas para os abortos de repetição. Os fatores podem ser divididos em: malformações anatômicas, alterações genéticas e imunológicas, fatores masculinos, doenças e hábitos de vida. Em todos os casos, a recomendação é que o casal que deseja engravidar procure um atendimento médico especializado para que possa ser analisado o histórico clínico do casal e a solicitação de exames complementares para identificar a saúde reprodutora de ambos. O objetivo é diagnosticar as possíveis causas antes de que os abortamentos aconteçam e buscar tratamentos ou alternativas.
Texto elaborado pela equipe de Especialistas de Produtos do DB Molecular.
Referências
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