Agosto Laranja — Conscientização sobre a Esclerose Múltipla
Publicado em: 10/08/2020, 14:40
Desde 2006, no dia 30 de Agosto, comemora-se o Dia Nacional de Conscientização da Esclerose Múltipla (EM). Ao longo deste mês promove-se eventos para que cada vez mais pessoas saibam o que é a EM, como diagnosticar, tratar e viver bem com ela.
A EM é uma doença neurológica crônica, autoimune, caracterizada por lesões inflamatórias no cérebro e medula espinhal. Na EM o sistema imunológico da própria pessoa passa a reconhecer a cobertura dos nervos, denominada mielina, como não próprio, iniciando um processo de tentativa de remover este corpo “estranho”. No entanto, o dano causado a mielina interfere na comunicação entre o cérebro, a medula espinhal e outras partes do organismo levando ao surgimento dos sintomas da EM.
A bainha de mielina é uma estrutura lipídica que envolve as fibras que são a parte longa em forma de fio de uma célula nervosa, aumentando a velocidade de condução dos impulsos nervosos e protegendo essas fibras, conhecidas como axônios, muito parecido com o isolamento em torno de um fio elétrico. Quando a bainha de mielina está saudável, os sinais nervosos são enviados e recebidos rapidamente. Mas quem tem EM os danos causado a esta estrutura resulta em alterações no envio dos impulsos nervosos, comprometendo o funcionamento do corpo. Afeta usualmente adultos na faixa de 18-55 anos de idade, mas casos fora destes limites têm ocorrido. No Brasil, sua taxa de prevalência é de aproximadamente 15 casos por cada 100.000 habitantes.
Há quatro formas de evolução clínica: remitente-recorrente (EM-RR), primariamente progressiva (EM-PP), primariamente progressiva com surto (EM-PP com surto) e secundariamente progressiva (EM-SP). A forma mais comum é a EM-RR, representando 85% de todos os casos no início de sua apresentação. A forma EM-SP é uma evolução natural da forma EM-RR em 50% dos casos após 10 anos do diagnóstico (em casos sem tratamento – história natural). As formas EM-PP e EMPP com surto perfazem 10%-15% de todos os casos.
Sintomas
A EM é uma doença desmielizante, afeta a mielina que envolve os neurônios, inflamatória, por apresentar intensa atividade de células imunitárias e degenerativa, por existir perda de neurônios com o passar do tempo. Geralmente os sintomas da EM variam de acordo com a intensidade e a localização das áreas de inflamação no sistema nervoso. Podemos listar como sintomas mais comuns:
— Fadiga: Um dos sintomas mais comuns nos portadores da EM, percebido por cansaço desproporcional à atividade realizada, tanto física quanto mental. Pode se intensificar principalmente quando o paciente se expõe ao calor ou quando faz um esforço físico intenso;
— Problemas visuais: Visão embaçada, turva ou dupla (diplopia). Decorrente de inflamações nos nervos ópticos ou no tronco cerebral;
— Problemas de equilíbrio e coordenação: Perda de equilíbrio, falta de coordenação, tremores, instabilidade para caminhar. Decorre em geral de inflamações no cerebelo;
— Sensação de peso nas pernas e braços: Chamada de espasticidade, é percebida como rigidez de um membro ao movimentá-lo, ocorrendo principalmente nos membros inferiores. Muito frequentemente decorre de inflamações na medula espinhal;
— Alterações na sensibilidade: Sensações de queimação, formigamento ou mesmo dor podem ocorrer em diferentes partes do corpo. Por exemplo, nos membros inferiores, decorrentes de inflamação na medula espinhal. Podem ocorrer na face, como neuralgia do trigêmeo, decorrente de inflamação no tronco cerebral;
— Transtornos cognitivos: Memória pode ser afetada e ocorrer mesmo no início da doença, independentemente da presença de sintomas físicos. Decorrem de alterações mais difusas no cérebro, mas podem ser devidas a lesões específicas, por exemplo, sobre o hipocampo, área especializada no processamento da memória;
— Dor: Este é outro sintoma relativamente frequente, sendo em geral de moderada intensidade. Pode ocorrer como sintoma da neurite óptica (dor ao movimentar os olhos para os lados) e na neuralgia trigeminal (uma dor aguda bem intensa de um lado da face).
— Fraqueza muscular: A fraqueza muscular é um sintoma comum na EM. O problema está relacionado à dificuldade do estímulo em transitar ao longo de vias que foram acometidas por lesões inflamatória.
— Distúrbios emocionais: Sintomas depressivos, ansiosos, irritabilidade, flutuação entre depressão e mania (transtorno bipolar) pode ocorrer;
— Sintomas na bexiga e intestino: Urgência para urinar, vontade de urinar várias vezes ao dia, dificuldade em esvaziar a bexiga completamente, constipação intestinal, menos frequentemente incontinência fecal. Decorrem de inflamações na medula espinhal geralmente;
— Tremor: Acredita-se ser o tremor devido principalmente a lesões no cerebelo ou em suas vias, responsáveis também pelo equilíbrio e coordenação. É um movimento involuntário, rítmico, alternado, que em geral acomete os membros superiores, inferiores e a cabeça. Muitas pessoas com EM podem desenvolver tremor, em geral tardiamente, especialmente nos casos com uma resposta parcial ao tratamento. O tremor pode surgir lentamente ou se desenvolver de forma rápida, ocorrendo durante recaída (surto). A EM progressiva pode cursar com tremor que se torna mais acentuado ao longo do tempo.
— Espasmos: Espasmos são contrações involuntárias súbitas de um músculo ou um grupo muscular resultante de nervos danificados. A maioria dos espasmos ocorrem nas pernas e braços.
— Intolerância ao calor: O aumento da temperatura tende a promover uma desaceleração da transmissão nervosa. Danos à mielina significam que os impulsos nervosos já estão sob tensão e, portanto, condições de calor podem provocar uma piora dos sintomas.
— Distúrbios sexuais: Disfunção erétil nos homens e diminuição de lubrificação vaginal nas mulheres são sintomas frequentes. Comprometimento da sensibilidade do períneo (região da genitália) interferindo no desempenho do ato sexual também é relatada.
Diagnóstico
O diagnóstico é feito com base nos critérios de McDonald, exame de ressonância magnética (RM) do encéfalo que demonstrará possíveis lesões características de desmielinização, exames laboratoriais (HIV, Treponema pallidum e dosagem sérica de vitamina B12) no sentido de excluir outras doenças de apresentação semelhante à EM. A deficiência de vitamina B12, neurossífilis ou infecção pelo HIV (o vírus HIV pode causar uma encefalopatia com imagens de ressonância magnética semelhantes às que ocorrem na EM) apresentam quadros radiológicos semelhantes aos de EM, em alguns casos. O exame do líquor será exigido apenas no sentido de afastar outras doenças quando houver dúvida diagnóstica, por exemplo, suspeita de neurossífilis.
Coronavírus e Esclerose Múltipla
Sabe-se que muitas terapias modificadoras de doença para EM funcionam suprimindo ou modificando o sistema imunológico. Assim, as recomendações para pessoas vivendo com EM são baseadas principalmente na medicação que fazem uso. De acordo com o Comitê Brasileiro de Tratamento e Pesquisa em Esclerose Múltipla e Doenças Neuroimunológicas (BCTRIMS):
— Betainterferonas e Glatirâmer: essas medicações não aumentam de forma significativa o risco de infecções virais ou sua gravidade. Desta forma, é recomendado manter o tratamento com esses fármacos durante a pandemia.
— Teriflunomida: é provável que essa medicação também não aumente de forma significativa o risco de infecções virais ou sua gravidade. Desta forma, é recomendado manter o tratamento com esse fármaco durante a pandemia.
— Fumarato de dimetila: em geral, não aumenta de forma considerável o risco de infecções virais. No entanto, alguns pacientes podem ter redução significativa na contagem de linfócitos (um tipo de célula do sistema imune) e por isso apresentar risco maior de infecções. Neste caso, recomendamos discutir com seu médico a necessidade de uma medida específica.
— Fingolimode: o fingolimode aumenta o risco de contrair infecções virais e pode aumentar a gravidade dessas infecções. Por outro lado, a interrupção abrupta do fingolimode pode levar a um “rebote” da atividade da EM, com surtos potencialmente graves. Dessa forma, recomendamos a manutenção do tratamento, porém com atenção redobrada às medidas de higiene e distanciamento social. Sugerimos que discuta com seu médico a periodicidade dos exames de rotina.
— Natalizumabe: o natalizumabe não causa imunossupressão, mas pode aumentar o risco de infecções do sistema nervoso central. A recomendação inicial é de manter o tratamento, pois é, provavelmente, uma medicação segura nesse cenário. Em alguns casos, pode ser avaliado, junto ao seu médico, uma extensão do intervalo entre infusões de 4 para até 6 semanas.
— Ocrelizumabe, rituximabe, alentuzumabe e Cladribina: essas medicações promovem alterações de longa duração no sistema imune, levando a um risco maior de infecções virais e maior gravidade dessas infecções. Caso você esteja planejando iniciar um destes tratamentos, pode ser prudente adiar a primeira dose e discutir com sua equipe médica opções. Se já estiver fazendo o tratamento e tenha uma nova dose programada, também pode ser aconselhável adiar. Na hipótese de já tiver recebido recentemente o tratamento, recomendamos cuidado redobrado com as medidas preventivas e distanciamento social. Se a coleta domiciliar dos seus exames de rotina não for possível, pode ser razoável um espaçamento maior entre os exames durante o período da epidemia, desde que com autorização do seu médico.
— Prednisona: pacientes com doses diárias de prednisona abaixo de 20 mg/dia e que não usam outra medicação imunossupressora provavelmente não apresentam redução significativa de sua imunidade e devem seguir medidas gerais de cuidado. Pacientes com doses diárias de prednisona superiores a 20 mg/dia, ou qualquer dose de prednisona associada a outra medicação imunossupressora (como azatioprina ou micofenolato de mofetila) devem adotar medidas de prevenção rigorosas.
— Azatioprina e Micofenolato de Mofetila: essas medicações são habitualmente utilizadas para o tratamento da Neuromielite Óptica e devem ser mantidas. Embora normalmente sejam realizados exames laboratoriais de rotina, se você está com uma dose estável da medicação e sem complicações, pode ser seguro adiar a coleta desses exames, a depender da recomendação da sua equipe médica.
Assim, se você estiver tomando algumas das medicações listadas, há a necessidade de um cuidado maior em relação à prevenção e, se for exposto ao COVID-19 ou tiver a infecção por COVID-19 confirmada, entrar em contato com o seu neurologista.
Texto elaborado pela equipe de Especialistas de Produtos do DB Molecular.
Referências
CONITEC -http://conitec.gov.br/images/Consultas/2019/Relatorio_PCDT_Esclerose_Multipla_CP03_2019.pdf
BCTRIMS - https://www.bctrims.org.br/wp-content/uploads/2020/03/2o-Comunicado-BCTRIMS-Epidemia-do-Coronav%C3%ADrus-COVID-19-INFORMA%C3%87%C3%95ES-AOS-PACIENTES.pdf